O álbum Vera Cruz, lançado por Edu Falaschi em 2021, foi escolhido por Pirika para análise.
The Trooper
Pirika
Antes de falar do álbum em si, vale falar do trabalho que
foi feito em torno dele. Além da divulgação durante o processo de criação, o
álbum veio recheado brindes pra quem comprasse na pré-venda e os itens são bem
legais, deu até uma balançada. Outro ponto bem significativo na minha opinião
foi a obra da capa, honestamente é uma das capas mais bonitas que eu já vi em
um cd de metal.
As músicas mantêm uma boa qualidade ao longo do cd mas é na
sua segunda metade que o cd realmente brilha. Tirando Fire with Fire,
que não minha opinião é a mais fraca do cd, desde Land Ahoy até Rainha do Luar
o cd é maravilhoso. Um bom cd para todos nós fãs de Edu, Viper, André, Angra,
Shaman, etc.
Top 3: Mirror of Delusion, Land Ahoy, Rainha do Luar. Shame Pit: Fire with Fire.
Nota: 7,1
“Don't
cry, I will love you
Forever
I'll See
Your
blue eyes caring for me
For all
eternity”
The Magician
O trabalho é bom.
Veracruz é um álbum musicalmente maduro e complexo que utiliza
como base das composições um conto ficcional heroico adaptado no início da
história luso-brasileira. No conjunto da obra Edu & Cia. conseguiram afinal
entregar uma obra bastante plausível no sentido de se justificar a proposta
padrão do Heavy-Metal de sub-gênero, de entreter as pessoas com um conteúdo mais
profundo do que o “normal de mercado”, e ainda por cima garantindo a coerência
musical/lírica.
Comecei já com a conclusão porque nada do que eu escrever
daqui em diante muda essa conclusão, por mais que minha resenha a partir desse
ponto possa parecer uma viagem de ida e volta com diferentes impressões sobre
vários pontos relacionados ao mais recente trabalho de Edu. O trabalho é bom, e
merece o reconhecimento do segmento como uma peça fixa do que o Metal nacional produziu
de bom.
Nota 7,7 ou \m/\m/\m/\m/.
Bom, vamos começar a viagem.
Para começar, e até como propaganda do trabalho – por que
não? – segue abaixo o vídeo conceito de arte de Veracruz disponível no Youtube
oficial da banda, que narra a faixa introdutória do disco (atores de rádio de
segunda linha, segundo o Trooper). Gostei da arte, mas o inglês com certeza é
macarronada – como o inglês do próprio Edu Falaschi no decorrer das faixas – ,
e a narrativa exageradamente eloquente me traz a memória os saudosos CDs de RPG
da Abril de meados dos anos 90 e começo de 2000, com ‘atores amadores de rádio’
(First Quest, Mystara – Karameikos...).
Como fica óbvio na visualização do vídeo e na disponibilização
da trama no site oficial da banda, o protagonista não é um índio (tá viajando
ae Pirika? Nas letras das faixas Frol de La Mar e Land Ahoy fica clara a
travessia do Atlântico pelo herói português), mas sim um europeu portuga que
escapou da morte em sua tenra idade, com sua vida ameaçada por carregar a marca
do ‘escolhido’ conforme profecia.
Se eu fosse um crítico dos dias de hoje de literatura, iria
sair mencionando negativamente o fato de a contextualização da trama não trazer
a diversidade como foco, já que o herói não é índio, negro, mulher, homossexual...
mas sim um branco europeu de olhos azuis, e logo, uma história batida e datada,
fora da época inclusiva como vivemos atualmente (e nem adianta amenizar com a
freira do convento e com o xamã que adota o herói principal em terras
tupiniquins, Edu). Porém, eu prefiro focar outras características da história,
ao criticar sim esse roteiro do escolhido – “chosen one” - com sua marca de
nascença que corrobora a profecia, isso sim é datado pra kct (um dia ainda vão
cantar sobre um paladino caído destruidor que nunca resgatará a bondade, nem
mesmo em seu momento derradeiro...). Como o próprio editor do site deles
comenta, a história é maniqueísta, mais do que deveria talvez, e o bem e o mal
é pintado em opostos bem delineados com poucas dúvidas nesse sentido (talvez,
ao apenas ler as letras das músicas, a reflexão apareça na ótima Bonfire of The
Vanities), ou seja, vilões e heróis construídos dentro do estereótipo clássico e
surrado (prefiro as verdades dúbias de The Metal Opera ou The Black Halo). Por
outro lado, existe um lado bom de criar um ópera rock ou um ópera heavy-metal,
ainda que o conto pareça ser história da carochinha como é o caso aqui, isso dá
uma noção de completude absurda ao escutar a musicalidade complexa e
progressiva do álbum; um facilitador principalmente aos mais jovens que se
interessam ou por música, ou por literatura, em outras palavras: é a aplicação de
uma forma bem competente de angariar fãs para a banda e para o gênero como um
todo.
Minha crítica sobre o ‘modismo’ na narração do herói que nasce
predestinado para cumprir com seu destino de derrotar o mal - e veja só
você....de fato o derrota (!!!) - está mais relacionado à ingenuidade desse
tipo de mensagem, mas não quer dizer que eu tenha deixado passar os diversos detalhes
que resgatam os fatos históricos e a simbologia cronológica mencionada em Veracruz
(mas que no final das contas pode ser entendido também como uma tentativa
desesperada e desnecessária do Edu em graduar seu trabalho em um tipo de
prateleira ‘pseudo’ intelectual, assim como faço em minhas postagens). A marca que
o tal herói Jorge da ficção tem no peito é a cruz de sangue que o próprio Jorge
da Capadócia tinha em seu braço segundo os mitos da época, ele que foi também um
guerreiro mártir predestinado, e que foi em determinada época padroeiro de Portugal
(reino que herdou o símbolo da “Cruz de Jorge” dos ingleses durante o cerco de
Lisboa, que por conseguinte roubaram o símbolo dos navegantes da República de Genova
que dominavam os mares da borda atlântica ao mediterrâneo, como forma de acesso
clandestino de suas naus nas rotas marítimas, e Gênova, por sua vez, herdou a
cruz em sua bandeira por ser derivada da fragmentação do Império Bizantino,
esse governo sim homenageou diretamente São Jorge, por ser natural de seu território
e por ser considerado soldado mártir de Roma). Para fechar o arco a história
Edu insere a Ordem da Cruz de Nero, símbolo que representa os braços prostrados
e caídos da cruz, do imperador Nero de Roma, um notório perseguidor de cristãos
e culpado pela crucificação do próprio São Pedro, criador da igreja católica. Esse
background criado para o conteúdo lírico de Veracruz é interessante, mas não é
exatamente novo (em Dante’s Inferno o protagonista costura a cruz de Jorge em
seu peito) e não muda o fato de a linha narrativa principal ainda ser uma
simplória luta manjada de bem vs. mal.
Já o termo Veracruz – verdadeira cruz - seria mais associado
à coroa espanhola e aos lideres de sua armada que se autoproclamavam detentores
da “cruz verdadeira” dentre tantas outras que ocupavam os mares na época das
navegações, e assim batizaram diversas cidades em suas vastas colônias (já que
os portugueses utilizavam como marco de colonização seu famoso “padrão-português”,
nas costas descobertas – ainda hoje pode ser visitado em Porto Seguro-BA, ou em
Cape Agulhas na África do Sul), a mais famosa delas no México trazia como se fosse
um lembrete em seu brasão de armas as colunas de Hércules, que tal como os espanhóis
teria sido o primeiro a desbravar novos mares e terras ao afastar com os
próprios ombros o estreito de Gibraltar na península Ibérica. Portanto, me
parece que Edu coloca o termo no título do trabalho mais como uma estampa
comercial sobre a história que criou, do que de fato, como um axioma que
amarraria todo o contexto lírico-musical. Adicionalmente a frase “Alis Volat
Propriis” que aparece na capa do álbum também não pareceu se relacionar
diretamente com a história do herói que não “voa pelas próprias asas” (frase
meritocrática de merda), que aliás, muito pelo contrário, nasce como um
abençoado por Deus com um início-meio-fim já direcionado pelo destino sagrado.
Para apurar mais minha análise sobre a ‘literatura’ da obra,
precisaria adquirir a versão pré venda do álbum com o encarte de 20 páginas, mas
por um infortúnio imprevisto, não consegui (vou comentar mais a frente).
Agora vamos refletir um pouco sobre a musicalidade do álbum
(vou pegar leve, se chegou até aqui, você aí deve estar bem cansado dessa
papagaiada...).
Embora o acabamento do material artístico/visual/lírico
tenha sido elaborado com bastante cuidado, conforme já citado, acredito que o
ponto alto do trabalho – como deve ser – está em sua sonoridade.
O line up da banda é animal, só tem fera – como diria o
Faustão. Mas o mais interessante é notar que embora obviamente Edu tenha a
palavra final sobre a mixagem (eu sei.. foi do brother do Helloween) e sobre a
produção, dá pra ver que o vocalista não podou nenhum dos membros da banda no
sentido de aplicar a técnica sobre as linhas. O resultado é uma explosão maluca
na sonoridade, com guitarras piruliteiras full-time, que solam até mesmo enquanto
o Edu está cantando seus versos. As linhas de guitarra possuem abordagem
claramente sinfônicas e ultra melódicas, e embora os intervalos maiores sejam
predominantes, os cromatismos exagerados aparecem em todas as faixas sem
exceção, a ponto de eu ter a impressão real que não houve nenhum dos
aproximadamente 44 semi-tons existentes na tessitura do instrumento que deixaram
de ser tocados nesse trabalho. Quando a velocidade da digitação está em seu
limite, Roberto e Diogo dão um jeito de emendar ligados de tappings de grande
extensão para progredir com as suas frases... os dedos dos caras dever ter
ficado só o osso na gravação desse álbum! Mas segue uma alfinetada para os
professores: Não percebi nenhum sweep em suas execuções super técnicas, que é a
verdadeira carta na manga de um piruliteiro iluminatti.
A despeito do desperdício e da gastança de notas das
guitarras nesse trabalho (estamos em época de priorização da sustentabilidade,
lembram???), e do cansaço que isso possa causar, a linha melódica e harmônica das
composições é bastante interessante, e por causa unicamente da coerência dessa
linha mestre das pautas conduzidas por Edu, que o álbum verdadeiramente se
sustenta (o cara pode ficar fritando o quanto quiser na sua guitarra brilhosa,
mas no final do dia lá está a cruel limitação da interação entre as 12 únicas notas
perceptíveis aos nossos ouvidos). Se for para elogiar o trabalho dos
guitarristas, devo citar o solo dobrado da faixa “Land Ahoy”, esse sim progride
entre notas abafadas e outras alcalinas, que passam uma ideia de tensão, com início,
corpo e conclusão bastante delineados e coerentes.
Sobre a cozinha e os demais integrantes, o trabalho complementar
do tecladista Fabio Laguna é providencial (nesse tipo de trabalho sempre será),
e a contribuição de Aquiles é rica sem ser exagerada (exagerada igual aos
últimos trabalhos do Angra e Sepultura, que também possuem bateristas desse patamar);
aqui ele conduz com propriedade todos os tempos necessários e propostos nas
canções, mas realmente adiciona aquele “a mais” em Veracruz quando tem que
trazer os elementos culturais nativos brasileiros no set de percussão.
Edu está com uma sintonia muito boa com as demais partes, em
relação à execução de suas linhas vocais, nada espetacular, mas são seguras e terminam
por protagonizar o trabalho (bem mais fácil quando é o ‘dono da bola’ que puxa
todo o resto, como já disse várias vezes aqui no blog).
Para finalizar a resenha sobre o conteúdo sonoro. O Trooper
tem razão quanto à mensagem “feliz” transmitida pela maior parte das
composições, essa é uma impressão que de fato, tive também ao iniciar minha
audição de Veracruz. Há de se citar que os intervalos maiores e as progressões
ascendentes nas escalas contribuem em muito nessa percepção; um outro aspecto
nesse sentido é a utilização de acordes maiores nas harmonias dos teclados e violões
quando esses são usados, caracterizados pela terça ‘aumentada’ ou ‘aberta’ (*).
Todas essas características devolvem momentos alegres na audição por repetidas
vezes, mas acredito que ao escutar com certo distanciamento as melodias, o
resultado não é bem esse, e arrisco dizer que em alguns momentos a tensão e o
lado mais ‘dark’ aparecem conforme a narrativa lírica das músicas. Essa abordagem
que brinca com o senso melódico do ouvinte é realmente muito presente nesse gênero
de Heavy-Metal, particularmente nas obras de Weikath (Helloween).
E aproveitando essa deixa, eu acredito de verdade que se a ascensão
do que chamamos aqui no Brasil de Metal Melódico (Speed Metal) não tivesse sido
abruptamente interrompida por pressões
mercadológicas da indústria musical norte americana, todo esse segmento de
musica pesada iria evoluir para exatamente o que o Edu construiu nesse trabalho.
Por isso, parabéns Edu, de coração, por continuar a trilhar o caminho glorioso
e esquecido do Heavy Metal (você é oficialmente um “Metal-Hero”, mas sem a
marca de nascença).
Pontos adicionais sobre Veracruz:
- Ainda prefiro Fragile Equality;
- Essa participação do Max em “Face of The Storm” transformou
essa música e uma pusta de uma obra prima;
- Os pontos altos na média (fora Face The Storm) do álbum
ainda estão no que o Edu faz de melhor: suas baladas-modernosas-to-be, como em “Skies
In Your Eyes” e “Bonfire of The Vanities”.
- A Elba acabou sendo uma participação inexpressiva em minha
opinião, mas diferente da Sandy em Omni, que participou sem ter vontade de colocar
a voz na gravação, acho que a Elba Ramalho foi pouco usada, relegada a basicamente
cantar apenas um verso e ser back vocals no resto da música.
(*) explicando rapidamente: todos os acordes são a soma da
nota ‘prima’, que representa o tom-pedal ou mais grave do acorde, somado da 5ª
nota do intervalo, que possui sem exceção uma atitude ‘neutra’ sobre o tom
principal, e com a oitava (mesma nota que a prima), que serve na verdade pra reforçar
o acorde. Até aqui você tem um Powerchord reforçado (1ª+5ª+8ª), com a adição da
quarta nota, uma “terça” tonal você passa a dar uma característica sonora mais interessante e composta, que reproduz no
nosso cérebro uma sensação ou de alegria ou de melancolia; a terça-maior (‘open’
ou aumentada), ou seja, tocada um semi-tom acima na escala, irá resultar em um
acorde “feliz”, enquanto a terça natural ou a terça diminuta, ou seja, tocada
meio-tom abaixo, ira reproduzir uma harmonia melancólica).
p.s: tentei comprar a edição especial digipack da pré venda que estaria supostamente disponível na loja oficial do site da banda, mas infelizmente o site negou a tentativa de compra por cartão de crédito (4 cartões diferentes, meus e da patroa). E tenho certeza do problema não ser nos cartões, já que além de utilizar regularmente para compras on-line tinha acabado de utilizar um deles, além de utilizar com sucesso em outro site de e-commerce após essa tentativa inútil no site do Edu, somente para testar se havia algum problema mesmo. Tentei entrar em contato pelo whatsapp disponível no mesmo canal on-line da banda, mas é lógico, ninguém retornou o contato.......
Como depois dessa resenha densa estou meio cansado vou
descer o nível para dizer o seguinte: parabéns pelo trabalho feito com esmero
Edu, e vai tomar no seu rabo por essa bosta dessa sua loja on-line não
funcionar direito e não ter suporte para solucionar. Depois fica ai falando
bosta sobre chupar pau de gringo, provavelmente os sites dos caras funciona!!!
Mas parabéns mesmo assim (vou ter que comprar a versão ordinária do álbum mesmo... ☹).